Logo a primeira lágrima se misturou com a chuva e todas outras vieram, minhas pernas cederam sob meu peso e eu escorreguei minhas costas pela porta até que encontrasse o chão. Meu coração parecia parar, minhas pupilas se dilataram, eu respirei fundo.
Eu era tão covarde, que não tinha coragem para continuar, e muito menos coragem para terminar.
Fechei meus olhos, meu coração acelerou toda a coragem que eu consegui achar em mim, serviu para virar aquele vidro de comprimidos garganta a baixo.
Nenhuma carta, nenhum bilhete, nada, era assim que tinha que ser.
De repente toda mágica se acabou, e eu não tinha controle sobre meu corpo, meu coração falhou e eu prendi a respiração.
*Melissa*
- Valentina, abre essa porta! – meu punho batia contra a madeira da porta. – Droga Valentina, abre logo! – dessa vez eu chutei a porta. – VALENTINA ABRE ESSA PORRA LOGO. – eu gritei, um vizinho curioso apareceu.
- Mas que diabos menina?
- Ela não tem o costume de deixar a chave travada na porta – passei a mão pelos olhos, eu não perderia o controle, não desta vez. – será que daria para arrombar?
- Você promete parar de gritar? – perguntou o garoto
- Abra logo! – Com alguns empurrões o garoto abriu a porta – Obrigada. – entrei porta adentro procurando o interruptor. – Valentina! – chamei sem obter resposta, a casa nunca ficava em absoluto silêncio e aquilo me deixava com uma sensação estranha no estômago.
A luz que saia pelas frestas da porta do quarto me chamou a atenção em meio à penumbra da casa. Meus dedos tocaram de leve a maçaneta fria, um arrepio correu pela minha espinha e eu empurrei a porta.
Não, não podia ser! Ela parecia dormir, a chuva forte molhava seu rosto e eu rezei pela primeira vez eu rezei para que ela estivesse viva, as palavras falharam, o ar faltou em meus pulmões.
- Valentina! – Foi à única palavra que eu consegui pronunciar, eu não tinha forças para tirá-la do chão, por um segundo tudo pareceu parar, eu notei seu peito se mexer, ela ainda estava viva. O tal garoto entrou no quarto, e me ajudou a carregá-la até o carro.
Meu peito parecia explodir a cada batida do meu coração, minhas veias pareciam carregar areia ao invés de sangue, tudo parecia mais devagar e o tempo mais depressa.
[...]
*Valentina*
Eu não sentia nenhuma parte do meu corpo, será que tudo tinha dado certo? Eu não consegui abrir os olhos, deixei então que a sensação me levasse de volta para outro lugar.
Não, eu não tinha morrido ainda. Alguém puxava um tubo grosso pela minha garganta, eu ainda estava viva. Tentei levantar a cabeça, mas só consegui sentir mais náusea do que antes, voltei a fingir que dormia.
Aos poucos eu fui acordando novamente com uma enfermeira aplicando alguma coisa em mim.
- Você teve sorte, pirralha. – Desviou os olhos para uma garota que dormia na poltrona – Essa daí não saiu do seu lado.
Tentei sentar na cama, só consegui mexer a cabeça para os lados. Acabei dormindo novamente.
Abri os olhos e encontrei os seus, um sorriso sincero.
- Da próxima vez que você fizer isso comigo, eu juro que eu morro só pra te matar de novo. – seus dedos trilharam a linha do meu maxilar.
- Eu... – tentei falar, minha voz não saiu, uma lágrima escorreu do meu olho.
- Shii, eu estou aqui, não estou? – seus dedos novamente secaram minhas lágrimas, e eu acenei afirmativamente com a cabeça. Movi os lábios, “Me dá um abraço?”, e seus braços envolveram meu pescoço, seus cabelos caíram em meu rosto e seus lábios tocaram os meus levemente. – Acho que você sai amanhã
Afundei minha cabeça no travesseiro e pedi para que o amanhã nunca chegasse, seu polegar secou a lágrima que escorreu pelo canto do meu olho e ela sorriu, ela me seguraria.
[...]
Meus medos, meus anseios, meu ódio, meus fracassos têm sempre o mesmo gosto amarelo e amargo que seca a garganta, tudo isso sempre me alimentou, todos os meus erros, talvez eles ainda estivessem vivos, se eu não fosse uma inconseqüente, eles estariam vivos e eu seria menos infeliz.
O reflexo no espelho refletia quem eu realmente era: frágil, insegura, culpada e mentirosa. Uma lágrima solitária correu pelo meu rosto e nesse momento tudo desabou, eu não tinha coragem para olhar a imagem refletida no espelho, minhas mãos transformaram-se em punhos que estilhaçaram o espelho, em meio à bagunça de cacos, lágrimas e sangue eu me deixei cair no chão, pedindo para que ninguém me encontrasse.
Quando abri os olhos, seu rosto estava perto do meu e ela sorria para mim, sorria de forma simples e delicada, seus dedos afastaram uma mecha de cabelo que caia sobre meus olhos e ela sorriu novamente mordendo o lábio inferior, suas mãos procuraram as minhas tocando de leve as feridas recém abertas e seus lábios roçaram por cada uma delas de forma maternal e carinhosa.
- Viu! Elas vão sarar – disse secando minhas lágrimas que voltavam a cair. – beijinhos curam tudo, principalmente os meus.
Eu não consegui sorrir, meus olhos não conseguiram encarar os seus e suas mãos me tiraram do meio dos cacos do espelho e me abraçaram, eu não tinha forças para não chorar.
- Chorar é a melhor forma de acreditar que tudo vai ficar bem.
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